quinta-feira, abril 06, 2006

A Sorte e a Determinação, artigo de Pedro Afonso (Jorge Sampaio e a vida de duas crianças)

A Sorte e a Determinação

Há cerca de 8 anos, as duas gémeas, Oriana e Andreia terminavam a escola primária. Apesar de ser grande a vontade de prosseguir com os estudos, os seus destinos – por falta de recursos – estavam traçados: iriam trabalhar no campo e nas tarefas domésticas.

O infortúnio era justificado por terem nascido numa família pobre e viverem em Mafómedes, uma pequena aldeia no concelho de Baião. A escola onde poderiam continuar a estudar ficava a cinco quilómetros e não havia dinheiro para os transportes. Porém, a 20 de Janeiro de 1998, tudo mudou. O Presidente da República, o Dr. Jorge Sampaio, visitou o local e sensibilizado com aquela situação, intercedeu. Finalmente, a Câmara Municipal de Baião decidiu assegurar-lhes o transporte e os estudos lá continuaram.

Apesar de o caminho não ter sido fácil, a determinação e esforço tiveram os seus resultados. Actualmente, estudam na Universidade de Coimbra: uma cursa direito e a outra radioterapia.

Este caso faz-nos pensar!...A vida destas raparigas será certamente melhor do que a de seus pais. Contudo, esta mudança foi um golpe de sorte, uma oportunidade que surgiu porque houve um presidente da república que visitou o local e se interessou pelo caso. Se assim não fosse, muito provavelmente, hoje teriam uma vida de miséria e pobreza. Mas acima de tudo, foi uma oportunidade agarrada com esperança, coragem, empenho e muita determinação. Estas são qualidades que devem ser enaltecidas e servirem de exemplo para muitos alunos.

Sabemos, porém, que há uma geração de jovens que fantasia uma vida fácil e assume uma existência hedonista. São jovens mimados, viciados em jogos de computador e em downloads na Internet; passam horas em frente à televisão a consumir telenovelas, não gostam de estudar e raramente se esforçam para terem sucesso nos estudos. Ao mesmo tempo, habituaram-se a exigir dos pais e da sociedade um futuro, para o qual, pouco ou nada fizeram para que fosse melhor.

Estamos assim perante duas realidades que nos entristecem a todos: um país pobre que não cria igualdade de oportunidades e uma geração que acredita que o conforto a riqueza e o progresso se constroem “à sombra da bananeira”.

É uma vergonha para todos sabermos que existem crianças no nosso país, cujo futuro depende da sorte de terem a visita de um político ou do interesse da comunicação social pelo seu caso. Contudo, ao mesmo tempo existem outras crianças que têm todas as condições e apoio no ensino e depois não aproveitam. Mais tarde, hão-de perceber que afinal, o verdadeiro sucesso é aquele que provém do talento, do empenho e do trabalho.

A nossa sociedade é consumista, ambiciosa, mas globalmente ainda pouco instruída. Ora, isto leva a que tenhamos grandes dificuldades em competir num mundo cada vez mais globalizado e exigente; se nada fizermos, aos poucos seremos remetidos não só para um atraso científico e cultural, como ainda para um empobrecimento económico. Apesar das contrariedades, continuamos a sonhar com “castelos no ar” e a reclamar um melhor nível de vida. Talvez por isso é que somos o país europeu que mais investe per capita no Euromilhões. Receio, no entanto, que a fortuna não venha dessa forma!

Tal como sucedeu com as gémeas Oriana e Andreia, para muitos jovens a sorte já terá aparecido nas suas vidas. Mas…infelizmente não a aproveitaram, ou pior ainda, nem tomaram consciência disso!


Pedro Afonso
pedromafonso@netcabo.pt

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