terça-feira, julho 15, 2014

Padres pedófilos: quem dá os números ao Papa?




No La Stampa saiu este artigo que reproduzo abaixo.

"14/07/2014
Quem é que dá os números ao Papa?
Marco Tosatti

É difícil escrever sobre um objecto vago e com contornos difusos como é uma entrevista desmentida, ou melhor, desmentida em parte mas não no sentido global, como a que resultou da conversa entre Eugenio Scalfari e o Papa.
Mas há um ponto da conversa que merece atenção, porque levanta questões de grande peso. É o dos abusos.
Os padres que os cometeram serão mesmo 2% do total (ou seja mais de 8.000)?
Os números que se conhecem até hoje dizem o contrário.
MARCO TOSATTI

É difícil escrever sobre um objecto vago e com contornos difusos como é uma entrevista desmentida, ou melhor, desmentida em parte mas não no sentido global, como a que resultou da conversa entre Eugenio Scalfari e o Papa. Mas há um ponto da conversa que merece atenção, porque levanta questões de grande peso. É o dos abusos.

A certa altura, na sua reconstrução, Scalfari escreve, partindo da sua pergunta: Um fenómeno muito espalhado?

"Muitos dos colaboradores que lutam a meu lado asseguram-me com dados credíveis que a pedofilia dentro da Igreja se situa ao nível dos dois por cento. Este dado deveria tranquilizar-me mas devo dizer-lhe que de facto não me tranquiliza. Acho antes que é gravíssimo. Dois por cento dos pedófilos são sacerdotes e até bispos e cardeais. E outros, ainda mais numerosos, sabem mas calam, punem mas sem dizer o motivo. Considero que este estado de coisas é insustentável e é minha intenção enfrentá-lo com a severidade que requer.

A frase acaba assim, sem as aspas a fechar.

Mas é o valor de 2% relatado por Scalfari que gera grande perplexidade.

E temos que perguntar:
a) se o Papa realmente o disse;
b) quem é que lhe fez o cálculo;
c) se Scalfari o relatou fielmente.

Os padres no mundo são perto de 410 mil. Dois por cento quer dizer mais de 8 mil. Um dado que diverge com todos os dados conhecidos até hoje.

A UCCR (Unione di Cristiani Cattolici Razionali) pergunta num artigo recente: "Mas quantos são os padres implicados na pedofilia?

O Vaticano revelou os números oficiais perante a 52ª Comissão da ONU contra a tortura: entre 2004 e 2013 um total de 884 membros do clero foram reduzidos ao estado laical no âmbito do escândalo da pedofilia.

Outras medidas disciplinares foram aplicadas a 2.572 sacerdotes (em muitos casos por serem de idade avançada ou doentes).

Portanto, estes são os números sobre os quais se pode trabalhar.

Se somamos 884 com 2.572, no total temos 3.456 sacerdotes católicos pedófilos em dez anos.

Os padres católicos no mundo, segundo o departamento de estatística do Vaticano, são cerca de 410 mil, uma média aproximada entre os 405 mil do ano 2000 e os 413 mil do ano 2010, números próximos das médias dos anos 60 e 70.

O cálculo é fácil: os 4 mil padres pedófilos correspondem a 0,8% dos padres católicos no activo nos últimos 10 anos.

Certamente, um só caso de abuso já é demasiado, porém podemos verificar que não se trata de percentagens elevadas, mais, são decididamente moderadas em relação aos números que atingem pais, colegas, professores, treinadores e familiares em geral (a maior parte casados, portanto não celibatários)."

O professor Davide Cito, da Universidade Pontifícia da Santa Cruz, que trabalha neste campo com as instituições da Santa Sé fala de 400 casos que anualmente chegam a Roma para serem avaliados.

E sublinha que em 90% dos casos trata-se de vítimas masculinas adolescentes, dos 16 aos 18 anos; ou seja não são casos de pedofilia, mas de efebofilia, ligada ao fenómeno da homossexualidade.

Pode perguntar-se por que razão o Papa não faz esta diferença tão importante.

Mais: em 2010 o "grande inquisidor" vaticano, agora bispo em Malta, Charles J. Scicluna, colaborador de Bento XVI na grande batalha lançada por aquele papa contra o fenómeno dos abusos de todo o tipo, dizia:

"Nos últimos nove anos (2001-2010) fizemos a avaliação das acusações relativas a 3 mil casos de sacerdotes diocesanos e religiosos que se referem a delitos cometidos nos últimos 50 anos. Podemos dizer que em geral 60% destes casos são sobretudo actos de efebofilia, ou seja devidos à atracção sexual por adolescentes do mesmo sexo, 30% são relações heterossexuais e 10% são actos de verdadeira e própria pedofilia, isto é determinados por uma atracção sexual por menores impúberes. Os casos de padres acusados de pedofilia verdadeira e própria são, assim, cerca de 300 em nove anos. Trata-se sempre de demasiados casos – obviamente – mas temos de reconhecer que o fenómeno não é tão generalizado como se faz crer".


Então é caso para perguntar: se Scalfari – coisa que falta demonstrar – recordou a resposta com rigor, quem é que dá os números ao Papa?"

Termino este post com um grande, comovido e grato, abraço a todos os Padres com quem me cruzei na minha vida. Grato pelas Missas, pela Comunhão, pela amizade, pelas Confissões, por todos os sacramentos, pela companhia, por tudo. Obrigado pelas vossas vidas e sacerdócio!



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