terça-feira, fevereiro 03, 2004

Uma iniciativa de realçar!

Com alegria me chega ao conhecimento de uma iniciativa de algumas pessoas da sociedade civil que tem recebido o apoio de muitos amigos das associações de defesa da vida. Trata-se do Abaixo Assinado Mais Vida Mais Família (lançado no passado Sábado, dia 24 de Janeiro, em Lisboa) cujo propósito é fazer sentir junto dos órgãos de decisão política que, ao contrário do que a barragem de fogo da comunicação social e dos abortistas, permitiria concluir, não recolhe o apoio de camadas significativas da população portuguesa, as propostas em discussão de referendo e de liberalização até ás 10 ou 12 semanas.

Este movimento civico tem, do ponto de vista operativo, como objecto único a promoção de um abaixo assinado (divulgarei o site onde se encontra, desde que disponível) de âmbito nacional dirigido aos órgãos de soberania com os seguintes objectivos:

1. Reafirmar que a valorização da vida humana deve continuar a merecer, no Código Penal, a protecção, a todo o tempo, da vida intra-uterina, através da definição como crime da sua violação;

2. Pedir que a Assembleia da República e o Governo, cada um dentro da sua competência específica legislativa e regulamentar, aprovem:
a) O reforço da vida e dignidade de cada ser humano, no decorrer da actual revisão constitucional;
b) Um regime legal de protecção jurídica de cada ser humano, na sua fase embrionária;
c) Iniciativas legislativas de promoção da família nos domínios fiscal, laboral, habitacional, da segurança social, da saúde e da educação;
d) E medidas concretas de defesa da vida e da dignidade de cada ser humano, em particular da mulher, muito em especial de apoio à mãe grávida em dificuldade, bem como ao recém-nascido.

Além de, na informação que me fizeram chegar, darem os seus contactos:
- Isabel Carmo Pedro (91 7334912)
- Teresa Adão da Fonseca (93 4855645)
- Luís Pereira de Almeida (93 7209125), este movimento anunciou já que são as seguintes, as associações que apoiam esta iniciativa:
- Associação Mais Família
- Associação Vida Norte
- Jovens Socialistas Católicos
- Associação Vida Universitária
- Federação Portuguesa pela Vida
- APMV - Associação Portuguesa de Maternidade e Vida
- APFN - Associação Portuguesa de Famílias Numerosas
- Juntos Pela Vida Associação
- Mulheres em Acção Associação.

Para um político é um conforto perceber que as posições que defende não são apenas pessoais mas correspondem a um movimento social que tem capacidade de mobilização, a virtude da indignação e a ousadia da sua própria afirmação. Por isso, força amigos!
Num tempo e momento em que se procura sistematicamente deturpar a posição da Igreja Católica sobre a questão do aborto, usando e abusando de declarações dos seus responsáveis hierárquicos, são de saudar Notas como esta (do Bispo de Angra) em que a doutrina é reafirmada e esclarecida.
Sempre no entanto com esta nota que verifico cada vez mais verdadeira: para ser contra o aborto livre chega um uso adequado da razão (vide artigo recente de José António Saraiva no Expresso). A fé, "apenas" vem iluminar e confirmar a razão e, ao mesmo tempo, ajuda a fazer um juízo lúcido sobre as razões verdadeiras da atitude humana perante o aborto (próximo post com comunicado de Comunhão e Libertação).
A Nota é esta:

Diocese de Angra

NOTA PASTORAL

DEBATE SOBRE O ABORTO

1) Reacendeu-se, na sociedade portuguesa, o debate sobre o aborto. Embora, à primeira vista, possa parecer extemporâneo e com algum aproveitamento político, este debate é uma ocasião propícia para esclarecer ideias e aprofundar as questões.

De todos os quadrantes afirma-se que é uma questão de consciência. E está certo. Em tudo, é preciso agir em consciência. Só que para um católico, inclusive político, a consciência tem de ser formada à luz do ensinamento da Igreja, que importa, neste momento, explicitar.

A posição da Igreja é clara, como foi reafirmado ainda recentemente pelo Secretariado Permanente da CEP, a propósito da instrumentalização das declarações do Bispo do Porto. A Igreja opõe-se, seja ao aborto, como à sua despenalização, não sendo de sua competência determinar a pena, na ordem jurídica civil.

2) O sentido da argumentação de fundo da Igreja é este: o fruto da concepção é um novo ser humano, que iniciou a sua própria existência. Precisa ser defendido, tanto mais quanto, no caso do aborto, é uma vítima inocente e indefesa. Um Estado de Direito tem de tutelar a vida, desde o começo até ao seu termo, com leis apropriadas.

“A Igreja opõe-se a todas as tentativas legais ditas de ‘despenalização’ do aborto, não porque queira acentuar a pena, mas porque todas elas supõem a legitimação da prática do aborto, que passe a constituir um direito da mulher grávida, com intervenção activa das estruturas de saúde pública. Mesmo quando o aborto se torna permitido, como nos casos previstos na lei actualmente em vigor, do ponto de vista religioso e na ordem canónica, o aborto continua a ser uma desordem moral. Nenhuma lei civil pode alterar a verdade fundamental do carácter inviolável da vida humana, como dever moral grave, já expresso no 5º Mandamento do Decálogo” (CEP, 2003/12/16).

O aborto é uma medida drástica, que não pode ser aceite, como método de contracepção, porque elimina uma vida.

Diz-se: “A mulher é dona do seu corpo”. Mas o ser concebido não é o seu corpo; é outro corpo e outro ser. Não se podem resolver os problemas complicados, em que pode vir a encontrar-se uma mulher grávida, à custa de outra vida.

3) Na cultura actual há tanta sensibilidade – e isso é sinal de avanço da civilização – na defesa da natureza e dos animais, na protecção das crianças, em relação aos crimes de abuso sexual. E os nascituros, quem os defende?

Isto não é uma questão religiosa. É uma questão de humanidade. A Igreja não faz outra coisa senão reforçar uma posição da razão humana, iluminando-a com a luz da Revelação Divina.

O que não significa insensibilidade relativamente ao drama das mulheres, que se vêem forçadas a recorrer ao aborto, como foi expresso pelo Bispo do Porto. Não basta condenar e penalizar o aborto. Urge criar condições, para que ele não aconteça. São precisas medidas políticas de apoio à família, à mulher grávida e às crianças. Importa agir e legislar em favor da vida.


4) Falando da participação dos católicos na vida política, esclarece a Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé, citando João Paulo II: “Quantos se encontram directamente empenhados nas esferas da representação legislativa, têm a “clara obrigação de se opôr” a qualquer lei, que represente um atentado à vida humana. Para eles, como para todo o católico, vale a impossibilidade de participar em campanhas de opinião em favor de semelhantes leis, não sendo a ninguém consentido apoiá-las com o próprio voto... (cf. Evangelium Vitae, n. 73).

“A consciência cristã bem formada não permite a ninguém favorecer com o seu voto a realização de um programa político ou até de uma única lei, em que os conteúdos fundamentais da fé e da moral estejam subvertidos pela apresentação de propostas alternativas ou contrárias a tais conteúdos.” (Congregação para a Doutrina da Fé, Católicos na vida Política, 2003, n.º 4).

Daqui a grande responsabilidade dos católicos, inclusive políticos, quando a acção política é confrontada com princípios morais irrenunciáveis, como é o caso do aborto e da sua despenalização. Exige-se a coerência da fé, em consonância com o ensinamento da Igreja.

+ António, Bispo de Angra

Angra, 30 de Janeiro de 2004.

Finalmente de regresso e agora determinado à fidelidade...

Excelente artigo o de António José Saraiva sobre a morte do jogador do Benfica!
Sempre me impressionou, particularmente nos últimos anos, a dificuldade de aceitarmos a morte, as constantes censuras às pessoas, ao sistema, à organização, por alguém ter morrido, por uma tragédia ter provocado mortes...como se tudo estivesse nas nossas mãos...
Não sabemos o que fazer da vida, quando não aceitamos a morte...

Por isso aqui transcrevo esse artigo, com a devida vénia:

O mito da imortalidade

«Todas estas interrogações, todas estas perguntas, reflectem uma coisa: temos dificuldade em aceitar a morte.»
NÃO acontece muitas vezes.
O jogador acabara de ser punido com um cartão amarelo - e tinha ainda os olhos de milhares de espectadores em cima e as câmaras da televisão apontadas para ele.
Então, curvou-se para a frente, pôs as mãos nos joelhos e tombou para trás.
Pelo modo como o corpo caiu percebeu-se logo que já era um corpo sem vida - visto que não se protegeu, deixando a cabeça bater no chão sem um gesto de defesa.
A comoção foi geral - no campo e em casa.
Mas, passados os primeiros momentos de incredulidade, as perguntas começaram a surgir.
As insinuações.
Primeiro veladas - mas cada vez mais explícitas à medida que o tempo passava.
Teria a assistência sido a melhor?
Haveria no estádio o equipamento médico necessário para acorrer a casos destes, concretamente um «desfibrilhador»?
Não teria a ambulância demorado tempo demais?
A noite encarregar-se-ia de responder a todas as perguntas.
A assistência tinha sido impecável.
Fora feito tudo o que as regras aconselhavam: desde colocar o jogador de lado à massagem cardíaca no próprio local.
O «desfibrilhador» existia.
A ambulância entrou em campo quando a equipa médica lhe deu ordem para entrar, ou seja, quando entendeu ser o momento adequado para transportar o jogador para o hospital.
Esgotado o tema da assistência em campo, vieram então outras dúvidas.
Serão os exames aos atletas de alta competição tão completos quanto deveriam ser?
Não haverá negligência médica?
Não se poderia fazer mais?
Todas estas interrogações, todas estas perguntas, reflectem uma coisa: temos dificuldade em aceitar a morte.
Queremos encontrar sempre para ela uma justificação exterior - não admitindo que resulte de uma coisa inelutável: a vulnerabilidade da condição humana.
Queremos sempre acreditar que, se a assistência tivesse sido melhor, se houvesse mais um aparelho, se a ambulância tivesse demorado menos uns minutos, se, se, se, aquela morte poderia não ter acontecido.
No fundo, queremos convencer-nos de que a morte nunca é inevitável.
Que há sempre uma maneira de lhe escapar.
De a enganar.
De uma forma ou de outra - para nossa própria defesa - queremos todos acreditar no mito da imortalidade.
E então quando alguém morre no meio de um estádio, à vista de todos, com as câmaras de televisão em cima, custa-nos ainda mais a acreditar que aquilo é mesmo real.
Fehér era um atleta alto e belo.
Se há seres que parecem destinados à imortalidade, ele era um deles.
Quem pode portanto aceitar que na sua morte não tenha havido alguma coisa que falhou?
Que ela se deveu apenas ao facto de a condição humana ser, por natureza, frágil?
P.S. O realizador da SportTV que transmitia o jogo recusou pôr no ar imagens do rosto transfigurado de Fehér após o colapso. «Quero toda a gente fora da cara», ordenou aos operadores de câmara. Parabéns. O seu nome é Ricardo Espírito Santo.
jsaraiva@mail.expresso.pt