Munique
Não é todas as semanas que se vê um filme assim! Refiro-me mais concretamente ao último filme de Steven Spielberg, intitulado «Munique». Na minha opinião, uma das qualidades que o bom cinema deve ter – para além da função de entretenimento – é obrigar-nos a pensar sobre algo. Neste caso, foi o que aconteceu comigo. Dias depois de assistir ao filme, continuava a matutar naquelas imagens, reflectindo sobre um terrível fenómeno deste século: o terrorismo.
Em Setembro de 1972, durante as Olimpíadas de Munique na Alemanha, oito membros da organização palestina Setembro Negro, facção radical da Organização para a Libertação da Palestina (OLP) capturaram onze elementos da equipa Olímpica de Israel. Infelizmente, nenhum deles sobreviveu. Israel prometeu vingança e recrutou (alegadamente) na Mossad – os seus serviços secretos – uma equipa de agentes com o objectivo de vingar o crime cometido.
Com efeito, todo o filme é sobre uma «vendetta», de um povo sobre outro. É por isso, uma obra cinematográfica triste e bárbara. Evidentemente que o castigo dos culpados é um imperativo de uma sociedade organizada e civilizada. Hoje, ninguém aceita a justiça privada (fazer justiça pelas próprias mãos), será assim lícito um estado, qualquer que ele seja, baseando-se na antiga Lei de Talião (olho por olho, dente por dente), ordenar uma vingança?
Habitualmente, perante um conflito entre duas partes, nós procuramos fazer um julgamento moral e tomar partido de um dos lados (o dos bons). Curiosamente, aqui não há bons nem maus; mas tão-somente uma vingança. Não existe, por isso, espaço para ideologias, mas antes uma crueldade e um ódio que parecem não ter fim.
Apesar de retratar a primeira manipulação televisiva, à escala planetária, perpetrada por um grupo de terroristas, o filme acaba por ser anti-televisivo. Isto ocorre porque, ao contrário de uma certa banalização da violência com que somos confrontados diariamente nos telejornais, aqui o espectador é colocado diante uma violência autodestrutiva e contraproducente, ficando impossibilitado de identificar, o lado do bem e do mal. Ora, neste contexto psicótico é um absurdo defender qualquer ideologia.
Mas, «Munique» não se limita a abordar a questão moral da violência. Vai mais longe, questionando a origem de qualquer conflito entre culturas ou civilizações. De resto, o veneno está lá, muito bem representado; e o veneno é justamente a «vingança».
Embora muitos aspectos da vingança possam evocar o conceito de igualar as coisas – forçando o outro lado a passar pelo que a vítima passou, dissuadindo-o de repetir a acção –, a verdade é que ela tem habitualmente um objectivo mais destrutivo do que construtivo. Veja-se, por exemplo, as reacções de retaliação que estamos actualmente a assistir por todo o mundo árabe, pela publicação de umas caricaturas num jornal ocidental.
A vingança é um acto justiceiro e um vício contrário à justiça e, na perspectiva cristã, uma renúncia à caridade: «não te deixes vencer pelo mal, mas vence o mal com o bem», diz S. Paulo (Rom,12,21) .
Mesmo sendo judeu, Spielberg nesta obra, evita tomar qualquer posição. Opta por confrontar-nos com o percurso de uma personagem que supostamente vai fazendo justiça, conduzindo à morte vários seres humanos (terroristas), de uma forma cruel, trágica e imparável, até que surja finalmente a paz e o tão desejado regresso a casa. E será que isso chega a acontecer?
O filme «Munique», não agradou nem a Israelitas nem a Palestinianos. Talvez valesse a pena tentar perceber porquê?...
Pedro Afonso
pedromafonso@netcabo.pt
1 comentário:
Esse filme foi uma ótima "sacada"!
Uma visão geral da situação, sem tomar partido, faz você analisar e tirar as próprias conclusões.
Uma dica é assisti-lo e pensar em Maquiavel, como os grandes líderes, mandantes.. pois qual deles não leu?! O Príncipe sempre será uma referência em estratégias!
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