Ti Joaquina e Emily Letts
Na
semana passada, o nome Emily Letts terá sido dos mais referidos pela internet.
Entre comunicação social e redes sociais esta senhora gerou ódios, despertou
paixões e reacendeu debates. Gerou muita conversa. O que não gerou, porém, foi
um filho – dádiva de Deus para os devidos efeitos – que carregava no ventre.
Resumindo
a história, Emily é activista do aborto e trabalha no Cherry Hill Women's
Center. Parece que é, também, uma educadora sexual – seja lá o que isso for.
Até aqui trata-se de um retrato infelizmente algo comum, o incomum foi a
iniciativa que tomou: nada mais nada menos que filmar o seu próprio aborto e
colocar na internet à disposição de qualquer pessoa. Qualquer pessoa, sublinho.
Crianças, mães, pessoas que têm dúvidas e que certamente não precisam de ver
este vídeo. Todas têm acesso se quiserem.
Cereja
no topo do bolo: quando confrontada sobre aquilo que fez disse que «quis
mostrar que não é assustador»…
Para
além de falhar redondamente o objectivo, conseguiu uma coisa inédita: colocar
defensores do aborto repugnados com uma iniciativa tão… assustadora.
A
meu ver há duas questões a serem tidas em conta. Em primeiro lugar a falta de
respeito por si própria ao expor-se desta forma. A falta de respeito por si
própria ao assumir e publicitar uma forma de homicídio com uma leviandade sem
precedentes. Não sei se é o caso, mas certamente que esta Emily se sente grata
por a sua mãe não a ter achado um “inconveniente” e ter tomado a mesma
decisão.
Esta
nova cultura-tendência do “tudo é permitido”, para além de ser contra a
natureza humana, anula-se em si própria na medida em que, ao acharmos que somos
livres de fazer tudo o que queremos, acabamos por perder toda a nossa
liberdade, e pior, entrar no campo da liberdade do próximo. E este é só um
exemplo disto mesmo. Quando se fala de aborto não é de direitos da mulher ou
liberdade de escolha que se trata: é dos direitos daquele que inocentemente foi
gerado e que tem todo o direito a viver. Acima de tudo, tem direito a
viver.
Um
bebé não pede para ser concebido, mas quando dois adultos o concebem o mínimo
absoluto que se lhes exige é que assumam essa responsabilidade. Na vida é
assim. Cometemos erros, todos os cometem, e não dá para fazer “undo” e “começar
de novo” como se a vida fosse um jogo de Playstation ou um desenho no Paint.
Cometem-se erros e assume-se a responsabilidade. É assim todos os dias, não se
compreende como é que pode haver um grupo de pessoas ingénuas ao ponto de se
equipararem a um qualquer tipo de divindade com o poder de alterar o rumo
natural da existência.
Esta
filosofia de vida é perigosa. Este tipo de pensamento leva a premissas muito
perigosas. Defender que se tem o direito de destruir uma vida humana
embrionária não é muito diferente de defender que posso assassinar o meu patrão
se ele me decidir despedir, ou que posso atentar contra a vida de um professor
meu se ele me der uma má nota.
Na
realidade, entre estes exemplos, há uma diferença muito importante: é que o meu
patrão e o meu professor podem-se defender. Já o embrião humano não é ainda
dotado dessa faculdade. Ora, será preciso algum raciocínio muito elaborado para
se perceber que isto só torna este crime mais grave?
Assim
chegamos a uma conclusão importante. É que há um problema grave de défice. Não
de défice orçamental, mas défice de pensamento crítico, falta de raciocínio,
falta de análise nas coisas mais pequenas do nosso dia a dia. A sociedade
formata-nos no sentido de sermos executantes ao invés de sermos pensantes e
isso, para além de nos levar a poder admirar pessoas que não sabem pensar (caso
desta Emily), leva-nos a perder a nossa liberdade sem o notarmos, ficando até
com a sensação que somos muito livres.
Mas
pergunta (e bem) o leitor, por que motivo os executantes olham para estes
exemplos em vez de olhar para os outros, ou seja, por que é que as pessoas se
deixam influenciar mais por estes maus exemplos quando até haverá, certamente,
mais pessoas pensantes a expor muito claramente por que é que este e outros
crimes são verdadeiros atentados à dignidade humana. Simplesmente porque para
se compreender a real dimensão deste problema uma pessoa precisa de estudar,
pensar, escutar, e acima de tudo, tem de se comprometer e compromisso é a
última coisa que as pessoas querem ouvir falar neste momento. O ritmo frenético
das cidades e dos empregos fazem com que já não haja espaço para compromisso na
nossa vida, nem para aqueles que foram assumidos perante Deus, como o
casamento, como sabemos.
Este
raciocínio leva-me à segunda questão a ser tida em conta. É que uma certa
comunicação social, inspirada por esta leveza de espírito, diverte-se a fazer
das Emilys desta vida celebridades efémeras. Não que isto desculpe a atitude
desta senhora, não me interpretem mal, mas todos sabemos que, se não existisse a
cobertura mediática que se verifica, estes casos estavam reduzidos à
inexistência. Estou convicto disto.
Como
vem a propósito, deixem-me partilhar um exemplo que fala por si e que na sua
simplicidade consegue destruir as mais rebuscadas teorias anti-vida. É além do
mais um exemplo, também, daquilo que, se fosse um vídeo, dificilmente se
tornava “viral”.
Este
Domingo, a Câmara Municipal de Vila Nova de Famalicão, Distrito de Braga, vai
homenagear as mães com mais filhos do Concelho. Entre estas mães encontra-se a
“Ti Joaquina”. A Dona Joaquina é uma senhora com 88 anos de vida, a maioria dos
quais dedicados à profissão mais temida do momento: ser mãe. Não, não é uma
hipérbole minha. Em 22 anos a Ti Joaquina deu à luz, nada mais, nada menos, que
20 crianças.
Acham
que a Ti Joaquina vivia num palácio e tinha rendimentos anuais de um milhão de
euros (como fazem crer que é necessário para se ter filhos nos dias de hoje)?
Obviamente que não. Antes pelo contrário, trata-se de uma daquelas verdadeiras
heroínas da vida real, aquelas que contribuem mais para a humanidade que
qualquer super-herói da Marvel, mas que não ajudam a vender revistas e, por
isso, não costumam ter direito a legiões de fãs nem a grande holofotes.
Não
faz mal, a Ti Joaquina sabe certamente bem o que vale e não está disposta a
fazer de tudo por 5 minutos de fama como a nossa amiga Emily. Criou os seus
filhos com grandes dificuldades materiais, muitas vezes quando tudo o que havia
para comer era uma panela de sopa, mas, diz a D. Joaquina, «Tudo se
criou».
Cada
vez mais me convenço que há muitos letrados que têm imenso a aprender com estas
gentes simples. Vivam as Ti Joaquinas!
Bernardo
Serrão Brochado