Aborto: a sociedade mudou?
(publicado no Diário de Notícias de 3 de Março de 2004)
Entre outros méritos, a iniciativa cívica denominada Mais Vida Mais Família, cujo abaixo-assinado, de acordo com os seus organizadores, já reuniu até este momento 190.635 assinaturas (ou seja significativamente mais do que as 121 mil da petição, promovida pelo PS e pelo BE, em favor de um novo referendo sobre o aborto), tem aquele de confirmar que a sensibilidade da sociedade portuguesa em relação à questão do aborto é hoje, a mesma de 1998.
Não me parece possível outra conclusão quando um grupo de cidadãos anónimos, apoiados só por um conjunto de associações cívicas, em apenas quatro semanas (contra dois anos de reivindicação e quatro meses de presença nas ruas dos movimentos de sinal oposto) reúne um tão expressivo número de assinaturas, maior ainda (sublinhe-se) do que aquele que foi necessário para registar quatro grupos cívicos no referendo de 1998 (também 120 mil).
Percebo que afirmá-lo assim parece escandaloso. Sobretudo quando se atenta na cortina de fumo montada pela esquerda mais aguerrida, com a cumplicidade objectiva do “mainstream” da comunicação social. Uma cortina de fumo montada aliás com um propósito, não apenas ideológico. O objectivo real da oposição é o de, usando uma matéria fracturante, quebrar a unidade da coligação no poder…
Mas os sinais de que não existem grandes mudanças não se esgotam nos acima enunciados. Um jornal diário publicou-se recentemente uma sondagem completa sobre esta questão. Perguntava-se sobre as “razões” para abortar que os portugueses consideravam justificativas de uma modificação da legislação. Ora, quando perguntados sobre se estas razões incluíam as dificuldades económicas ou o simples não querer ter mais filhos, as respostas positivas somavam apenas 48%. Ou seja sensivelmente a mesma percentagem que em 1998 apoiava a liberalização do aborto até às 12 semanas, a pedido da mulher!
Assim, penso, não se pode senão concluir:
1. Existem neste momento dois países que coincidem no mesmo espaço: aquele que nos mostra a comunicação social, onde as posições como esta que expresso, não tem espaço nem respiração (com esta honrosa excepção), e um outro, bem real, onde vivem as pessoas de carne e osso, para quem o aborto não é a questão central das suas vidas. E que quando perguntados sobre este, o que exigem aos decisores políticos, são medidas concretas de defesa da vida e da família.
2. A sensibilidade da sociedade portuguesa é hoje a mesma de 1998 e, quanto muito, até pelos progressos da ciência médica e a difusão das tecnologias que revelam a vida intra-uterina, é hoje maior a consciência do valor e dignidade da criança por nascer e
3. A decisão, de rejeição pela maioria dos deputados na Assembleia da República, das propostas de aborto livre e até de referendo sobre esta matéria, correspondem à vontade de uma maioria significativa dos portugueses.
António Pinheiro Torres, deputado do PSD, fundador dos Juntos pela Vida.
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