terça-feira, março 23, 2004

Vale agora a pena recapitular o processo legislativo na assembleia: tudo começa com uma proposta do governo ou de algum dos grupos parlamentares. O projecto dá entrada na mesa da Assembleia, é anunciado em plenário e publicado. Se por lei for obrigatório é enviado para consulta publica. Apresentado na comissão respectiva é nomeado um relator para o mesmo (sempre de partido diferente do proponente). Este relatório consiste numa descrição do mesmo, na história legislativa da questão, algum direito comparado, quando justificável, considerações do autor do relatório sobre os (de)méritos da proposta. Segue-se-lhe as conclusões e o parecer. Votado em comissão este relatório, o projecto fica pronto a ser apreciado em plenário. Submetido a votação na 5ª feira seguinte ou passa e baixa outra vez à comissão respectiva (para debate na especialidade) ou é chumbado e não se fala mais no assunto...
Por vezes antes e por vezes depois: audições de especialistas na matéria ou dos parceiros sociais da área a que se refere o projecto.
Por trás disto e mais uma vez, horas e horas de trabalho: trabalho do relator em conjunto com os assessores da área, reuniões de preparação do debate (preparação de perguntas e intervenções), presença nas audições dos deputados a quem o debate diz respeito, idas e contactos com a comunicação social a defender os respectivos pontos de vista, às vezes seminários e colóquios sobre o tema (sempre certos nos diplomas de maior importância), contactos com organizações do sector a colher informações e sugestões, encontros com os responsáveis governamentais autores dos projectos, etc.
Tudo isto explica que mais ou menos rapidamente se percebe que não se vai conseguir seguir os assuntos todos que nos interessam e a especialização é o destino inevitável do deputado...
Na verdade ele tem de conciliar este seu trabalho com as tarefas que lhe surgem como deputado de circulo (despachar assuntos, encaminhar pedidos, encontrar responsáveis governamentais, organizar visitas a concelhos) ou outras como político: intervir em encontros fora do parlamento, despachar correspondência (o que tem de ser ele próprio a fazer porque só há uma secretária para cada grupo de 6 ou 8 deputados!), responder a quem o procura, receber em audiência quem lhe pede ou atendendo a distribuição de trabalho dentro do grupo parlamentar, representar o partido ou o grupo em ocasiões sociais e outras, escrever artigos, dar entrevistas, etc.
O segredo para sobreviver: perceber muito bem o que importa fazer, o que é o mais importante e útil politicamente. Esta parte é a mais dificil e acho que só agora me começo a aperceber disso...:-)
A dor disto tudo: pequenos assuntos, pessoas que nos procuram e ficam desatendidas, problemas pessoais que não tem solução e resultam da pequenez e pobreza do país. Uma verdadeira dor!
A alegria: o que se consegue fazer bem feito, as felicitações que às vezes nos chegam (com menos facilidade do que as reclamações...), as pessoas ou grupos que se sentem acolhidos e olhados, as vitórias politicas, um sentimento de que se está a fazer algo pelo bem comum.
Tudo somado, uma grande experiência!

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